terça-feira, 29 de novembro de 2011

O RAPPER DE DEUS




- Mãe, me dá dinheiro aí.
- Não tenho filho!
- Mãe, eu preciso de dinheiro. Se você não me der dinheiro, eu vou me matar.
- Já disse, filho: não tenho dinheiro prá te dar.
- A senhora não está acreditando em mim, não é? Então veja...
Renato pega as garrafas que estavam numa caixa e começa a quebrá-las, uma a uma, na própria cabeça. De repente, percebe que a mãe está sangrando. Não do sangue que escorre de sua cabeça, mas de um caco que se alojara no pescoço dela. Ele fica apavorado, no entanto não a socorre, só pensa em fugir para a rua, onde talvez consiga uma carreira.

Já fazem sete anos que Renato está nessa vida. Começou bebendo com os amigos e parceiros musicais, passou para o free-base (maconha com cocaína), depois só coca e, no final, o terrível crack. No começo ainda trabalhava, mas a droga exige exclusividade, então passou a só se interessar pela próxima pedra. Cansada de apanhar do marido na frente dos filhos, Cristiane o abandona. Daí, a viver nas ruas, foi questão de dias.

Filho de mãe solteira. Renato Augusto Alves da Silva nasceu em São Paulo, há 38 anos. Depois que o avô perdoou a mãe, voltaram para Santos e foram viver no morro de São Bento. Sua infância não foi muito diferente da de muitos garotos da periferia: jogar bola, soltar pipa, pequenos furtos aqui e ali, e alguns bicos para descolar alguns trocados. Carregou sacolas na feira a troco de frutas ou verdura, malas na rodoviária quando ainda não havia carregadores no local, e até teve um emprego formal como office-boy. Mas, foi apanhado furtando chocolates nas Lojas Americanas, perdeu as fichas de crediário do escritório e foi demitido.

Aventuras não faltaram na infância de Renato. Quando tinha 11 anos de idade, acompanhado do tio Marcelo e um amigo, invadiram uma avícola atrás de linha para empinar pipa. Um vizinho percebeu e chamou a polícia. Foram cercados pelos policiais e, sob a mira de revólveres, escaparam pelo telhado para o matagal, até o alto do morro, onde ficaram escondidos durante horas debaixo de chuva e com muito frio.

Foi quando se mudou para o bairro de Humaitá, São Vicente, que descobriu o rap. Ouvindo Dr. Dre, Jay-Z, 2Pac e outros rappers norte-americanos, descobriu sua vocação. Foi líder do The Boys Rap e Novos MC's (eleito três vezes o melhor grupo de rap da Baixada Santista). Chegou a gravar uma faixa do CD Força Rap Litoral Santista, com os Novos MC's. E junto com tudo isso veio o envolvimento com as drogas.

Sua luta para se livrar do vício durou anos, incluindo uma internação no Hospital Guilherme Álvaro, e só teve fim quando, através do amigo Serginho, entrou em contato com a Igreja Evangélica Peniel. Além do apoio dos fiéis e pastores, descobriu o Rap Gospel. A música que havia sido uma das responsáveis pela sua queda, era agora a sua alavanca para se levantar: junto com Sérgio (Mano S) e Ordiley (Negro Ordilla) formou o Sacerdotes MC's, onde adotou o apelido de Servo R. Além dos temas usuais, como a falta de oportunidades para negros e problemas de quem vive na periferia das grandes cidades, o Sacerdotes MC's prega a solução através da palavra de Deus. Renato acredita que tudo pode ser resolvido se seguirmos os ensinamentos da Bíblia.

Depois de se livrar do vício, Renato não só recuperou a auto-estima, como a união familiar e o respeito de muita gente de São Vicente que, não só o cumprimenta a toda hora, como pede conselhos e ajuda na solução de diversos problemas do cotidiano do bairro.

Os Sacerdotes MC's tem dois CDs lançados (Tirados Das Trevas Para o Reino da Luz, de 2003, e Gangsta Krente, de 2008) e está preparando o lançamento de um DVD.


Nenhum comentário:

Postar um comentário